A
negação do cristianismo como condição da nova filosofia
Toda a modernidade foi
um período de incoerências, contradições e indecisões. Nascia um novo tempo de
incertezas com o enfraquecimento da religiosidade dando inicio a liberdade da
razão. O poder divino já não estava tão em alta assim e já brotava nos
horizontes os primeiros indícios de uma república democrática. Assim, era esta
dualidade entre aqueles que insistiam em conservar o antigo e aqueles que
buscavam o novo que permeava o pensamento nesse período da história. Dentro deste contexto, surge então a seguinte
questão: qual é a real necessidade diante do antigo e desgastado modelo cristianizado
e da possibilidade de um novo modelo de mundo que agora se iniciava sobre a
égide da razão?
A história da
humanidade é a própria narrativa do desenvolvimento religioso com suas
respectivas nuances. Mas nunca se havia tido tanta contrariedade à forma de
pensar do homem como ocorrera no período moderno. Em passos lentos o homem foi
aos poucos percebendo que poderia ser mais ou fazer mais do que um simples e
mero coadjuvante no teatro da vida, surge então a idéia de livre-arbítrio e de
liberdade, de um deus que podemos enterrar, de um super-homem que pode com a
força de seu trabalho encontrar a felicidade.
A reforma da filosofia,
segundo Feuerbach, é um efeito consequente e necessário da máxima de que “Deus
é homem, o homem é Deus”, ou seja, tal reforma teórica dever-se-á adequar-se a
este novo modelo que se instaura ao longo dos anos modernos. A situação
paradoxal que contextualizava este pano de fundo histórico era a de um homem
preste a uma libertação política e daquele ainda subjugado a uma religião em
declínio. Então, não demora para que seja “decretada” a negação do cristianismo
e o grito solitário do homem ecoa em um
mundo agora vazio de espíritos, de regras morais, de fé. Milhares de anos do
pensamento filosófico e teológico agora são simplesmente deixados de lado em
detrimento de uma nova e sutil forma de dominação, a do Estado.
O Estado agora é a
realidade, é o céu na terra. Uma vez que aquele Deus protetor, conservador, sai
de cena para dar lugar a uma comunidade de homens que agora trocaram a fé em um
Deus transcendente pela política prática do Estado real.
Diante desse
imediatismo histórico cabe a filosofia então adequar-se a esta nova conjuntura
saindo do metafísico, do supra-sensível e adentrando na problemática social
humana, uma vez que na prática o cristão foi trocado pelo homem, deve também a
teoria inevitavelmente substituir o divino por aquilo que é prático do humano.
A filosofia, por
conseguinte, será, neste novo cenário, a causa comum e universal que deveria
tornar-se a si própria uma religião fundamental, assim como o era o
cristianismo. A religião que agora não mais se preocupa com as questões
religiosas deve tornar-se em si mesma a nova religião.
Decretou-se então o acabamento
da velha filosofia, a qual tentava em vão, dialogando com a teologia, buscar
uma explicação para o homem e para o mundo a partir da ótica de um deus
metafísico. Agora, uma nova filosofia é instaurada tendo por alvo de suas
explicações e discussões o homem a partir do próprio homem.
As bases do pensamento
protestante estabeleceram as diretrizes para o novo modelo de mundo, sem
dúvida, o pensamento religioso que se libertara da velha religião acabou por
abrir os caminhos para o domínio político sobre a própria religião, assim, o
grito de liberdade protestante caracteriza-se também por um apelo político
necessário em direção a liberdade. A religião que reformulou a religião
tornou-se política, elegendo por deus o Estado, tendo por adepto não mais o
devoto crente, mas o homem. Este apelo por uma liberdade política não deixa de ser
esperneio de revolta para com um sistema religioso que nunca morreu inteira e
completamente, ainda que a sua forma original já não se preserve mais.
Por fim, o presente
texto conclui que o homem moderno construiu laços que o homem contemporâneo agora
não consegue mais sair deles, ou seja, não há mais retorno para um mundo
capitalizado e globalizado cujos avanços tecnológicos e científicos despertos
pela modernidade jamais serão conformados com as realidades econômicas e
desigualdades sociais que são exigências deste sistema.
A conclusão disso é que,
da luta entre a religião e a liberdade política venceu o opressor e carrasco capital,
mamon tornou-se o deus deste novo século e a filosofia foi amputada e
decapitada, respirando apenas por seu passado de glórias e engolida por outras
disciplinas surgidas na contemporaneidade tornou-se genérica, artificial, mera
antropologia, perdendo sua essência mais sublime, a de ser uma filosofia verdadeiramente
filosófica.
Davi Gadelha Pereira
Davi Gadelha Pereira
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